O Guarda-Chuva Rosa- Capítulo 09

segunda-feira, abril 15, 2019


O Guarda-Chuva Rosa
Cap 9

Cena 1/Guarda-Chuva Rosa/Recepção/Interior/Manhã
Continuação da cena anterior:

Johanna: Ah pronto, era só o que nos faltava, uma conferência com a Gigi.
Ednna: Já até imagino do que se trata essa tal reunião.
Johanna: Ela não disse o motivo disso, Brigitte?
Brigitte: Não, mas é meio óbvio, né?
Brígida: (Debochando:) Hm, talvez seja por causa do show que a dona Johanna deu ontem de noite...
Johanna: Nossa querida, como você é espera, quer um prêmio? É óbvio que é por isso!
Ednna: Logo agora que as coisas tavam se ajeitando nos aparece mais essa.
Mara: Oxe, agora sim é que a gente se lasca de vez.
Johanna: Não fale asneiras, Helcimara. Talvez ela queira falar sobre o desfile, nossas modelos...
Yasmin: Desculpa dona Johanna, a senhora sabe que eu sempre fico do lado de vocês mas, agora não da pra defender, a dona Gigi vai dar sim uma baita bronca em vocês duas.
Ednna: Nós duas?!
Manuela: É claro né, dona Ednna. Vai xingar a dona Johanna por ter ficado bêbada e ter dançado no meio dum show sertanejo, e a dona Ednna por ter ido atrás da senhora no meio do palco.
Ednna: Ah, verdade, tinha esquecido desse detalhe...
Johanna: Nunca vi tanta desesperança numa pessoa só, e senhora ta no céu, Yasmin. Ah, só pode ser carma!



Cena 2/Pensão Dona Nicoleta/Sala de Café/Interior/Manhã

Nicoleta está servindo os hóspedes da pensão. Ela é uma mulher de sessenta, mas com uma alma jovem. Fofoqueira e barraqueira, ela não perde a oportunidade de ser inconveniente e cuidar da vida alheia.
Nicoleta: (Para um hóspede:) E aí Adamastor, continua chifrando a sonsa da Rosa?
Adamastor: (Cospe o café:) Eu não sei do que a senhora está falando...
Nicoleta: Ah, não? Acho que eu não fui muito clara. Chifrar meu filho, sabe? Botar guampa, trair, apunhalar por trás...
Adamastor: A senhora é uma impertinente, isso sim! Onde já se viu insinuar que eu traio a minha mulher...
Nicoleta: Mas eu não to insinuando não seu doutor, eu to afirmando mesmo.
Adamastor: Eu tenho mais de quarenta anos de casamento!
Nicoleta: Minha Nossa Senhora das Descornadas! Então a pobre da Rosa tem quarenta chifres na cabeça? Como é que ela consegue passar na porta sem se enganchar...
Adamastor: Eu já ouvi asneira demais por hoje. (Levanta:) Eu nunca mais vou comer nessa espelunca! (Sai).
Nicoleta: Ei, ei! Volta aqui seu salafrário, cê tem que pagar por esse pão de queijo e três dias de estadia! Vem cá o Bota-Chifre antes que todo o bairro saiba da sua sem vergonhice! Arre égua!
Bino: (Entra:) Se metendo em confusão de novo hein, Nicoleta?
Bino é o dono do restaurante ao lado, um simpático senhor. Ele e Nicoleta vivem em pé de guerra para saber quem é o melhor do bairro.
Nicoleta: E o senhor, que é que faz aqui no meu estabelecimento?
Bino: Ver essa sua cara de pata choca espantando a clientela.
Nicoleta: Mas é muito atrevimento num velho só. Rua daqui seu pelancudo centenário antes que eu chame o asilo pra te levar à força!
Bino: (Senta-se numa das cadeiras:) Ah nem se estresse com isso não querida. Cê chama o asilo e eu a vigilância sanitária pra fechar esse pedaço de sucata que você chama de restaurante.
Nicoleta: Vigilância sanitária? (Ri escandalosamente:) Faz-me rir, velhote enrugado. Meus produtos são os melhores da freguesia.
Bino: Só se for pra servir de veneno. (Pega um pão de queijo:) Olha esse pão de queijo aqui, puro mofo!
Nicoleta: Mofada vai ficar essa sua cara quando eu arranhar ela todinha. (Mostra as unhas:) Ta vendo isso aqui? Afiadíssimas!
Bino: Ui, que medo!
Nicoleta: Velho atrevido. Eu vou te mostrar o que é bom pra tosse. (Sai).
 Mara chega.
Mara: Seu Bino, quanto tempo!
Bino: Marinha, que saudade!
Mara: Que faz aqui? Eu pensei que tu e a bruxa velha, digo, dona Nicoleta se odiavam.
Bino: Ah e nos odiamos mesmo, eu que vim pra atazanar mesmo...
Mara: Bino, Bino, toma cuidado que essa mulher é um vendaval de saias hein. Lá na Bahia a gente chama esse tipo de “Arretada”. Coisa boa não.
Bino: Fica tranqüila, Mara, eu sei da conta daquela duas caras chantagista...
Mara: Bom, em todo caso se eu fosse o senhor, correria agora.
Bino: Correr? Mas correr por que?
Mara: Por que a dona Nicoleta ta vindo com uma vassoura na direção do senhor, e eu acho que ela não ta muito feliz não...
Bino: Ah, grande coisa que ela ta vindo com uma...Espera, o que?
Bino se vira e vê Nicoleta indo enfurecida com uma vassoura na mão em sua direção.
Bino: É, acho melhor eu dar com os pés! (Levanta e sai  correndo).
Nicoleta: (Batendo em Bino:) Vem cá, seu projeto de ancião, que eu vou botar isso aqui nos seus lugares mais profundos!
Bino: Socorro, louca!
Nicoleta: Ah, cê não me viu louca ainda!
Bino: Maluca, ordinária, eu vou te denunciar!
Nicoleta: Por maus tratos aos animais?
Bino: Aos animais?
Nicoleta: É claro, to agredindo um cachorro!
Bino: Ai, ai!
Bino corre até o outro lado da rua, em seu restaurante. No fim, ele bota língua para Nicoleta, que corresponde dando uma “banana” para ele.
Nicoleta: Cafajeste, ordinário. E se aparecer aqui de novo vai ganhar um banho d’água quente. Depravado!
Mara: (Comendo um hambúrguer:) É, vocês gostam mesmo duma riba...
Nicoleta: É que é o único jeito de dar um jeito nesse...(Percebe o que Mara come:) Mara querida, onde cê comprou esse hambúrguer ai?
Mara: Lá com o seu Bino. Baratinho, baratinho. Bem melhor que o daqui, que mais parece borracha vencida...
Nicoleta: (Aperta a vassoura com as mãos:) Ah é, não diga...
Mara: (Percebe a burrada que fez:) Ah, digo...Brincadeirinha, o da senhora é bem melhor, e ainda tem tomate, olha que beleza! Hehehe
Nicoleta: Corre.
Mara: É o que?
Nicoleta: Cê tem cinco segundos pra sair correndo daqui antes que eu arrebente essa sua cara traidora aqui mesmo, sua traíra!
Mara: Oxente!
Nicoleta: Quatro...
Mara: Mas dona Nick, eu só tava fazendo uma boquinha...
Nicoleta: Três...
Mara: Aquele treco tava até com gosto de meia furada!
Nicoleta: Dois...
Mara: Um horror, parecia papel amassado...
Nicoleta: Um.
Mara: Arre égua, só pode ser carma! (Sai correndo).
Nicoleta: Volta aqui sua mentirosa de meia tigela, que eu vou te mostra com quantas vassouradas se quebra uma cara!
Mara: É por isso que eu odeio as segundas-feiras. Ai!
Trilha Sonora: Mamãe Eu Quero – Carmen Miranda






Cena 3/Gigi Coffer/Sala da Direção/Interior/Manhã

Gigi: (Brava:) Eu gostaria de saber como é que vocês duas tiveram a coragem de fazer isso comigo. Tem noção da vergonha que eu passei vendo as duas naquela cena ridícula e ainda por cima ter que aturar os comentários dos críticos a respeito da minha “procedência” ?!
Johanna: Olha Gigi, nós sabemos que você ta chateada e tudo mais...
Gigi: Chateada? Chateada? Eu estou brava, zangada! Eu to possessa! Vocês já olharam as redes sócias, hein, já olharam? “Estilistas amigas de Gioconda Vanouse pagam mico em show de cantora em plena madrugada”. Isso é mais que um vexame, é uma verdadeira desgraça!
Ednna: Nós sabemos disso Gigi, sabemos.
Gigi: Ah vocês sabem? Pois não me parece que estão tão preocupadas como deveriam estar! Será que eu tenho que dizer que vocês duas agora voltaram a ser figuras públicas, procuradas, reconhecidas? Isso aqui pode prejudicar todo o desfile, já pensaram nisso?
Johanna: E você acha que a gente ta feliz com isso? É claro que não, foi um acidente!
Gigi: Um acidente que não podia acontecer. (Tira o óculos:) Meninas, vocês sabem que eu gosto muito de vocês duas. Eu nem pestanejei em contratar vocês quando me deram essa idéia. Aliás, eu confiei em vocês. Mas vocês tem que entender o meu lado, eu sou uma empresária do ramo da moda mais influente desse país. Eu não posso ser alvo de chacota da crítica por causa das minhas estilistas. Entendam, por favor. Eu preciso que sejam discretas, que não abusem da sorte. Precisam entender que são...
Ednna: Figuras públicas e influentes.
Gigi: Exatamente! E não é de praxe de uma figura pública, como vocês, fazerem esse tipo de...Coisa.
Johanna: (Levanta:) Acho que já ouvi demais.
Gigi: Johanna, espere! Não vai ficar brava comigo por isso, não é?
Johanna: Mas é claro que não. Isso não é culpa sua Gigi, nem da Ednna. Eu já entendi. A culpa é minha.
Ednna: Bom também não precisa exagerar!
Johanna: E eu lá to exagerando? Você mesma viu, eu que causei esse vexame todo. O Rio de Janeiro inteiro agora sabe da nossa situação, por minha causa. Você entende o quanto isso é ruim não só pra imagem da Gigi, mas pra todos da Guarda-Chuva Rosa?
Gigi: Johanna, isso não é o fim do mundo. Eu só to pedindo para que tenham mais cuidado com as suas atitudes fora da empresa!
Johanna: E eu entendi isso, Gigi, e a Ednna também, mas parece que eu não. Mas eu não posso fugir da responsabilidade, isso é culpa minha, e eu não consigo acreditar que fiz isso...
Ednna: Escute aqui, jararacazinha, em outros tempos eu ia sentar a mão na tua cara por ta falando isso. Já passou, caramba, esquece isso!
Johanna: Será que você não enxerga, Ednna, tudo o que ta acontecendo?
Ednna: O que você quer dizer?
Johanna: Não acha muita coincidência alguém ter tirada fotos minhas lá?
Ednna: Claro que não. Como a Gigi disse, somos figura públicas e...
Johanna: Nós éramos figuras públicas há quinze anos atrás. Ednna, até a noite de ontem nós éramos esquecidas do grande público, quem iria nos reconhecer lá se não nós mesmas, Brigitte, Manu e Gigi?
Ednna: Eu não...
Johanna: Não ta na cara, Ednna? Sempre tem alguém por perto pra sabotar os nossos planos. Até hoje eu não engoli aquela história do vazamento de gás na Top Model. E ainda mais aquele bendito guarda-chuva rosa lá!
Ednna: Cê ta insinuando que armaram pra gente?
Johanna: Mas é óbvio, criatura! Não lembra do bilhete que nós encontramos? Esse Rosa não para de seguir a gente. Quer nos destruir! E está conseguindo. Ele estava lá, na hora exata em que eu paguei o mico, tava a postos pra me difamar, pra acabar com as nossas remotas chances de dar a volta por cima!
Gigi: Meninas acalmem-se, por favor. Ter má sorte tudo bem, mas agora achar que alguém está perseguindo vocês, não acham que é paranóia demais?
Johanna: Não, não é. Você não da missa a metade, Gigi. Esse guarda-chuva nos assombra há anos, sempre lá, onde a gente menos espera. E o que a gente faz? Bota o nome da empresa justamente de Guarda-Chuva Rosa só pra atiçar mais e mais quem está nos prejudicando. Eu sabia que era uma péssima idéia...
Ednna: O que? (Levanta:) Dar a volta por cima, dar uma chance pra aquelas pessoas, voltar a ser minha amiga?
Gigi: Vocês voltaram a ser amigas?
Ednna: Cala a boca, Gigi.
Johanna: Mas é claro que não! Eu ia dizer que...Eu só ia falar que...Ah, que droga!
Ednna: Isso ta mexendo muito com você, Johanna. Não é feio pedir ajuda.
Johanna: Ajuda? Eu não preciso de ajuda. Preciso de resultados, respostas. Quem está nos seguindo? O por quê disso tudo?
Ednna: Eu não sei tanto quanto você, mas gostaria de saber pra botar logo um ponto final nessa droga de história de guarda-chuvas e explosões, e isso e aquilo, e disse-me-disse, e tudo! Mas você precisa manter a calma e parar de bancar a histérica pelo menos uma vez na sua vida e tentar manter a calma!
Johanna: E como eu posso manter a calma com um maníaco doido atrás de nós a cada instante querendo nos prejudicar?
Ednna: Por que você não vai estar sozinha! As meninas estão aqui, a Brigitte ta aqui. Eu to aqui, com você. Vamos superar isso juntas.
Johanna fica em silêncio por uns instantes.
Johanna: Eu acho que ainda não to pronta pra superar isso. (Começa a ir até a porta).
Ednna: Johanna! Aonde você vai?
Johanna: Pro cortiço, o aluguel não venceu ainda.
Ednna: Me deixa ir com você! Olha o teu estado!
Johanna: Me desculpa, mas eu quero ficar sozinha. Eu preciso ficar sozinha, pelo menos por um tempo até assimilar isso tudo.
Ednna: Só não se esquece de uma coisa, Jô.
Johanna fica surpresa ao ser chamada assim, pois Ednna não a chamava assim há anos.
Johanna: Do que?
Ednna: Que quando você estiver pronta, eu vou ta aqui, esperando você. Como eu sempre fiz.
Johanna: (Sorri:) Obrigada. (Sai).
Gigi: Ela não vai superar tão cedo, né?
Ednna: Não. Mas eu posso esperar. Ela é importante demais pra mim, não posso deixá-la agora.
Gigi: Imagina quando a Donna souber que vocês fizeram as pazes, ela vai pirar (Ri).
Ednna vira surpresa para Gigi.
Ednna: O que? Donna, Donna Cabonna ta aqui, no Rio?
Gigi: Mas eu já tinha te dito, criatura. Eu hein, cês esquecem rápido das coisas.
A cena corta em Ednna com um olhar desconfiado.



Cena 4/Cortiço/Casa de Claudine/Sala/Interior/Manhã

Claudine chega do mercado com uma sacola de compras na mão. Ao entrar e guardar as compras, Roberval sai do quarto.
Roberval: Onde é que a senhora estava?
Claudine: (Toma um susto:) Ah, Roberval, cê já acordou. Eu fui lá venda comprar uns ovos, leite e...
Roberval: Não minha querida, eu to falando de ontem de noite. Onde é que cê foi?
Claudine: De noite, ontem? Ora essa, não fui a lugar nenhum. Fiquei aqui, que nem cê tinha pedido.
Roberval: Hm...(Pega a bandeja de ovos:) Ovos brancos?
Claudine: Sim, bem novos até. Mas é isso, fiquei a tarde toda em casa e...
Roberval: (Joga a bandeja com os ovos no chão e grita:) Mentirosa!
Ícaro sai do quarto e passa a ver a conversar pela vão da porta.
Claudine: (Assustada:) Que qué isso, Roberval?!
Roberval: Os vizinhos me contaram que viram você saindo de noite e voltando às nove horas!
Claudine: Mas meu amor, isso é mentira! Eu...Eu fiquei aqui com Ícaro e...
Roberval: Ah, ficou? Então eu vou lá chamar o moleque pra comprovar essa história, e ai dele que minta pra mim!
Claudine: (Segura Roberval, assustada:) Não Roberval, deixa o menino em paz!
Roberval: Ué, mas pra que essa atitude? Se você tava com ele, ele não ia mentir.
Claudine: Eu...Eu...
Roberval: Você, você...Desembucha logo, Claudine!
Claudine: Eu saí, eu saí! Pronto, era isso. Eu saí sim ontem de noite mesmo você tendo proibido.
Roberval: E eu posso saber onde é que você foi?
Claudine: Eu fui procurar a Yasmin no trabalho dela. Foi isso.
Roberval: Mesmo eu tendo dito que não era mais pra fazer isso, mesmo assim você correu atrás da cadelinha ingrata, não é?
Claudine: Não fala assim dela, é minha filha, eu mereço respeito!
Roberval: Você não merece nada. Você é uma imprestável, uma mulherzinha de quinta categoria, que tem a capacidade de ir lá se humilhar pra aquela piranhazinha na frente de todo mundo. Você é patética, Claudine.
Claudine: Roberval você ta me ofendendo, para por favor.
Roberval: Cê já se olhou no espelho, Claudine? Não sinceramente, já se olhou? Você ta um bucho, gorda, mal vestida. E essas suas mãos ásperas que mais parece papel enrugado, que coisa horrível. Você é a pior classe de mulher que eu já conheci. Mas eu não vou ficar bravo com você por isso não.
Claudine: Não?
Roberval: Não.
Claudine: Ah que bom meu amor, por que eu pensei que você tinha...
Antes que pudesse terminara a frase, Roberval dá um tapa na cara de Claudine, tão forte que a fez parar no sofá. Ele a pega pelo braço com força, e ela começa a chorar. Ícaro fica assustado.
Roberval: Isso é pra você aprender que quem manda aqui sou eu. Eu nunca mais, me ouve bem! Nunca mais eu quero ver você indo atrás daquela menina, e nem menos sair sem dizer onde vai. Aliás, você ta proibida de sair.
Claudine: (Chorando:) Roberval cê ta me machucando, não faça isso por favor!
Roberval: Cê não gosta tanto de fazer aqueles seus panos velhos? Então, agora cê tem tempo até de sobra pra isso. A partir de agora é “sim, senhor  e não, senhor”, a última palavra é a minha. Eu mando, cê obedece. Entendeu, Claudine? Ou eu vou ser obrigado a te dar um corretivo todo dia?
Claudine: Não, por favor, não. Eu entendi.
Roberval: Ótimo. (Larga o braço de Claudine grosseiramente:) Agora vai pro fogão que eu to com fome, e não me vem com aquela massa de borracha que cê fez ontem, quero coisa chique, digna de mim. E quando eu voltar eu quero toda essa sujeira aqui do chão limpa, sabe por que? Por que eu odeio sujeira.
Claudine: Aonde é que você vai?
Roberval: Não é da tua conta. Cê não entendeu ainda? Quem deve satisfações aqui é você, e não eu. Vai rápido, que hoje eu to com uma fome de touro. (Sai).
Claudine se ajoelha no chão. Ela chora em silêncio, limpando os ovos no chão, com muita dor. Ícaro, desesperado, vai até o quarto da mãe. Ele mexe na bolsa de Claudine, procurando ajuda, até que ele encontra um cartão da Guarda-Chuva Rosa que Claudine pegou na entrada do prédio. Com o endereço anexado ao cartão e sabendo que sua irmã trabalha lá, Ícaro já sabia o que fazer.
Trilha Sonora: Fight Song – Rachel Platten


Cena 5/Copacabana Palace/Saguão/Interior/Dia

Katherine e Eddy (Eddy toma café de canudinho) estão tomando café sentados em duas cadeiras no saguão do hotel.
Katherine: Esse país é tão encantador, e ao mesmo tempo tão bonito. As pessoas, o clima, o sentimento mútuo de felicidade...
Eddy: Eddy não entende a Kate, Kate fala estranho.
Katherine: (Sorri:) Ai, Eddy, você é uma figura mesmo...
Eddy: Não. Eu sou uma pessoa mesmo.
Katherine: É, claro que é.
Katherine levanta para pegar um folheto na recepção, ao andar distraída ela acaba batendo de frente com o garçom Téo que carregava uma xícara de café para uma senhora, derramando o líquido acidentalmente no vestido de Kate.
Téo: (Assustado:) Ai, minha nossa! Minha desculpa senhorita, olha o que eu fiz! Deixa eu limpar pra senhorita, ai que desastre!
Katherine: (Gentilmente:) Não, não se preocupa, ta tudo bem.
Téo: Mas como? Eu acabei de sujar todo o seu vestido! Mas eu vou pagar por ele, eu juro. Talvez demore um pouco, mas eu posso economizar e...
Katherine: O que? Pagar um vestido novo? Ta brincando?
Téo: (Desesperado:) Não, senhorita, eu jamais faria brincadeiras com a sua cara, eu só quis, eu...Ai...
Katherine: (Põe a mão no ombro de Téo:) Eu disse que está tudo bem, foi um acidente, não precisa pagar por nada.
Téo: (Gaguejando:) Então quer dizer que a senhorita não vai acusar pro gerente?
Katherine: Acusar, eu? Claro que não, essas atitudes são de praxe das dondoquinhas ricas...E não precisa me chamar de senhorita. (Estende a mão:) Prazer, meu nome é Katherine, mas todos me chamam de Kate.
Téo: (Apertando a mão de Katherine:) Eu sou o Téo. É um prazer senhorita...Digo, é um prazer, Kate.
Katherine: Então, você trabalha aqui?
Téo: Já faz uns seis meses, ou sete? Nem lembro mais, o tempo passa tão depressa aqui que eu nem conto mais (Sorri).
Os dois ficam quietos por um tempo, até Téo tomar atitude.
Téo: Mas e você, faz o que? Ah, deve ser filha de algum deputado ou celebridade americana...
Katherine: (Um pouco brava e envergonhada:) Não, não sou. Eu sou modelo.
Téo: (Percebendo o erro que cometeu:) Ah, claro. Desculpe, é que esse hotel tem sempre esse tipo de pessoa, que quando a gente vê alguém assim, tão...
Katherine: Tão?
Téo: (Com brilho nos olhos:) Tão educada e bonita como a senhorita, digo, você...A gente até estranha.
Katherine: (Sorrindo sutilmente:) Obrigada. (Olha o relógio:) Ai, nossa, olha a hora! Eu to atrasada, tenho que ir. Foi bom te conhecer! (Começa a sair).
Téo: Ah...
Eddy chega ao lado de Téo.
Eddy: Não vai mesmo chamar ela pra sair?
Téo: (Toma um susto:) Ai! Quem é você?
Eddy: Eu sou o Eddy, e você ta jogando a chance de conhecer a minha amiga Kate não chamando ela pra sair.
Téo: Ah, é que...Eu não sei como...
Eddy: Ah, o Eddy sabe. (Gritando:) Ô Kate!
Téo: (Tapa a boca de Eddy com a mão:) Cê ta louco? Não é assim que se faz!
Eddy morde a mão de Téo.
Téo: (Assoprando a mão:) Ai, seu bruto!
Eddy: Se você não fizer nada, o Eddy faz!
Téo: Ta bom, ta bom, eu vou. Só não faz escândalo! (Sai atrás de Katherine).
Eddy: Essa é a minha especialidade...(Olha para um pote de biscoitos no balcão e fala, contente:) Biscoito!
Téo vai atrás de Kate. Quando ela sobe a escada ele, delicadamente, pega em seu braço.
Téo: Senhorita...Quero dizer, Kate...Você quer, digo, talvez você quisesse ou...
Kate o olha confusa.
Téo: O que eu to tentando dizer é...(Olha nos olhos de Kate:) Você aceita sair comigo hoje à noite?
Katherine: (Surpresa:) Oh, sair, with you?
Téo: Eu não entendi, mas posso considerer isso como um “sim” ?
Kate olha para Eddy, que do outro lado da sala começa a fazer um “certinho”, incentivando ela a sair com Téo.
Katherine: (Sorri:) Yes, pode.
Téo: Te espero hoje então...Às sete?
Katherine: Vou estar esperando.
Téo beija a mão de Katherine. Ela fica com as bochechas levemente coradas, e sobe as escadas.
Katherine: (Fazendo sinal com a mão:) Bye, bye.
Téo: (Sem jeito:) Tchau, tchau.
Eddy se aproxima de Téo.
Eddy: (Com a boca cheia de bolachas:) E aí, deu certo?
Téo: Deu, eu acho que sim. Sim, deu. (Feliz:) Eu tenho um encontro, eu tenho um encontro. (Cai em si:) Ai meu Deus eu tenho um encontro, eu tenho um encontro! E...E...E se eu falar besteira, e se meu papo for um saco? Eu nunca sai antes com uma garota na minha vida! E seu tiver mal hálito?! (Verifica se está com mal hálito:) Ah, eu estou sim com mal hálito!
Eddy: Nada que uma balinha de menta não resolva.
Téo: Mas eu nem tenho o que vestir, só esse terno de garçom e as minhas roupas velhas que são herança do tataravô do pai do tio-avô da amiga da concunhada da minha tia...
Eddy: Caraca, tu é paranóico mesmo hein...Depois dizem que é o Eddy que não bate bem...
Téo: Eu to arruinado, ela vai passar vergonha com um candango feito eu...(Senta na cadeira:) Ta tudo perdido...
Eddy: Ah não, nem pensar! (Pega Téo pelo cangote:) Escuta aqui, seu pingüim com bandeja, eu não uni vocês dois pra depois de tudo isso cê largar a minha Kate sozinha, tirando todas as esperanças dela de sair daquele quarto e ser feliz com alguém, e conhecer gente nova! Portanto, levanta essa bunda seca da cadeira e vai se arrumando, eu e você vamos às compras.
Téo: (Sem ar:) Tudo bem...Mas será que você pode...
Eddy: O que?!
Téo: Me deixar respirar?
Eddy: Oh, claro. (Larga Téo). Muito bem, bonitão, o Eddy vai dar um jeito nisso...
Téo: E eu posso saber com que dinheiro a gente vai fazer compras?
Eddy: (Pensando:) Hm...





Cena 6/Copacabana Palace/Quarto de Donna/Quarto/Interior/Dia

Eddy entra sorrateiramente no quarto de Donna. Na ponta do pé, ele abre a bolsa de Donna, pegando seu cartão de crédito.
Eddy: Agora sim, a gata borralheira vai virar Cinderela! (Ri).




Cena 7/Gigi Coffer/Sala da Direção/Interior/Dia

Gigi está cabisbaixa, rabiscando em um bloco de notas qualquer coisa. Ela apóia a cabeça no braço. Suspirando, ela disca um número no telefone.
Gigi: Marcela, manda todo mundo pra casa, vamos fechar um pouco mais cedo hoje. Não, não importa o motivo, só manda eles embora. Você pode ir também, eu fecho tudo hoje. Que seguranças coisa nenhuma, e eu lá sou mulher que não sei me defender? Dispensa também a contabilidade e avise a todos que amanhã estaremos fechados pra fazer um balanço geral. E daí que fizemos isso semana passada, minta e pronto. Olhe, apenas faça o que eu te pedi, antes que eu bote um dálmata no seu lugar, está bem? Obrigada. (Desliga).
A partir de agora, o restante da cena não terá um única fala. Gigi levanta e começa a guardar suas coisas na bolsa. Após guardar tudo, ela vai até a janela e observa a paisagem do Rio. A cena corta para a mansão de Gigi. Ela chega, entra no banheiro e começa a tirar a maquiagem, começando pela sombra e terminando no batom, tirando os grampos de seu cabelo.Tira também seus anéis, pulseiras, brincos, exceto o colar que sempre leva consigo, fazendo um coque em seu cabelo. Ela bebe um pouco de vinho, e senta-se em sua poltrona. Ela pega um porta-retrato e o observa, deixando poucas lágrimas caírem. (Importante: A foto do porta-retrato não pode ser mostrada ao público). Por último, ela põe a mão em seu colar e o aperta, fechando os olhos e encostando a cabeça na almofada. Tudo isso sendo mostrado ao som do tema musical de Gigi:
Trilha Sonora: That Distant Shore – Jennifer Paz
{Intervalo}


Cena 8/Guarda-Chuva Rosa/Sala da Passarela/Interior/Tarde

Vera da aulas sobre o “caminhar na passarela” para Yasmin e Manuela.
Vera: E é por isso que tem que se habituarem a usar sapatos de salto. Não que seja um regra, por que não é. Nem sempre vão usá-los, apenas em raras ocasiões. No meu tempo eles eram indispensáveis. Mas hoje em dia com tanta modernidade e novos conceitos do que é e o que não é bonito, eles acabaram no desuso. Mas mesmo assim devem aprender a andar com eles, pois nunca se sabe o que vão encontrar pela frente.
Yasmin: E eles não atrapalham na hora do desfile?
Vera: Atrapalham, e muito. Você vai sentir dores horríveis, calos gigantescos e vai se perguntar: “Onde é que eu fui amarrar o meu jegue?”. Mas são os ossos do ofício.
Yasmin: Claro...
Vera: Mas lembrem-se, vocês é que controlam o salto, e não o contrário. Vocês se acostumam com o tempo. Manuela, sobe na passarela. Vou te usar  de exemplo.
Manuela: Ai de mim.
Vera: Vamos, vamos.
Manuela sobe.
Vera: Desfila pra mim.
Manuela: Mas assim, na cara dura?
Vera: E você quer o que, meu bem? Um convite formal? Vamos, desfile.
Manuela: Ta bom...(Começa a desfilar).
Vera: Muito bom...Agora com isso (Da os saltos para Manuela).
Manuela: (Surpresa:) Com os saltos altos, agora?
Vera: Time is Money, meu bem.
Manuela calça os saltos. Ela desfila, porém rebolando muito enquanto caminha.
Vera: Ahá! Parada!
Manuela: (Para:) O que? Eu fiz algo errado?
Vera: Terrível. O erro mais comum que alguém não acostumado a usar saltos comete: Rebola muito.
Yasmin: Rebola muito?
Vera: Manuela, desfile de novo.
Manuela volta a desfilar.
Vera: (Para Yasmin:) Vê isso? Os movimento dos quadris ficam desregulados. Isso tudo por que nosso corpo não foi feito pra se apoiar nesse tipo de coisa. Não é saudável. E como vocês estão desacostumadas, só piora. A falta de equilíbrio faz com que, até mesmo inconscientemente, as modelo rebolam mais do que a conta para tentar se “reequilibrar”. E essa tentativa de tentar voltar ao equilíbrio acaba sendo falha, pois vocês não tem controle disso. E é isso que vamos treinar nas próximas aulas. Mas não hoje, meu expediente acabou.
Yasmin: Nossa, eu nunca pensaria nisso...
Vera: É claro que não bebê, por isso estou aqui. Muito bem senhoritas, chega por hoje. Tirem esses instrumentos de tortura dos pés e podem descansar. Nos vemos amanhã. Desculpe sair assim tão cedo, mas a feira me chama. E não se atrevam a fazer piadinhas por eu estar indo a feira. Gastei meu dinheiro e agora a coisa ta preta, ainda mais com essa crise. Bom, até loguinho queridas, beijinhos. (Sai).
Manuela: Eu to chocada...
Yasmin: E a gente pensando que a aula dela ia ser superficial e sem valor...Olha só que baita prova de que ela sabe das coisas...
Manuela: Agora só falta eu me acostumar com essas porcarias vermelhas (Tira o salto e joga na parede).
Yasmin: (Ri e também joga os saltos:) Eu também! Manu, eu vou indo lá pra cima, a Brígida pediu pra mim ajudar com uns documentos e coisas do tipo. Tudo bem?
Manuela: Aham, sem problemas. Boa sorte com a Bri.
Yasmin: Obrigada. (Vai até a porta:) Vou precisar (Sai).
Quando Yasmin sai, Manuela olha e confere se não há mais ninguém na sala.
Manuela: Mara, pode vim.
Mara entra por outra porta.
Manuela: Conseguiu ouvir alguma coisa?
Mara: Que nada, a dona Ednna ficou me chamando o tempo todo pedindo pra limpar a sala dela que eu não pude prestar atenção em nada. E aí, o que a modelete experiente ensinou hoje?
Manuela: Uma coisa muito importante.
Mara: Comer sem engordar? Se for fala agora, to precisando diminuir os pneus aqui...
Manuela: Melhor que isso. (Pega os saltos e mostra à Mara:) Como andar de saltos altos. (Sorri).
Mara: (Fecha a cara:) Ah ta. Desisto (Começa a sair).
Manuela: (Impedindo que ela passe:) Como é que é? Cê vai desistir só por isso?
Mara: Manu, olhe bem pra cidadã aqui. Tu acha mesmo que eu, uma balofinha baiana, vou andar nisso aí? Se eu cair, o chão racha. Mal consigo me equilibrar com as sapatilhas, imagina com esse negócio.
Manuela: Mas você vai aprender, e não vai embora. Por que eu não vou deixar. Sabe por que, por que eu não quero que você desista na primeira dificuldade. Ah qual é, Mara, nem tudo são flores. A gente tem que batalhar e se dedicar ao máximo se a gente quiser ter sucesso e vencer em alguma coisa.
Mara: Eu sei mas...É tão difícil...
Manuela: Ninguém disse que ia ser fácil. Eu sei que é difícil, mas você precisa tentar. Não só por mim, mas por você mesma. Pra se por à prova, sabe? Tentar, tentar, até conseguir. E eu sei que você consegue.
Mara: Cê acha mesmo, velho?
Manuela: Eu tenho certeza. (Entrega os saltos para Mara). Agora  sobe ai que a gente vai aprender juntas como é que se domina essa coisa.
Mara: (Olhando pros saltos:) Vem pra riba, filho duma égua!
As cenas seguintes mostram Mara e Manu ensaiando e tentando andar sobre os saltos. Mostra-se as duas perdendo o equilíbrio e caindo várias vezes, mas sempre se levantando rindo e tentando de novo.
Trilha Sonora: Quase Lá – Kakau G



Cena 9/Cortiço/Casa de Claudine/Quarto de Ícaro/Interior/Noite

Claudine está tomando banho. Ícaro vai a cozinha e pega dois panos de prato, amarra-os e faz um pequeno saco. Ele vai ao seu quarto e põe algumas roupas dentro deste saco de pano. Ícaro se dirige à sala, onde Roberval está dormindo no sofá. A passos silenciosos, ele passa pela sala e chega a porta. Tirando do bolso o cartão, ele olha novamente o endereço da Guarda-Chuva Rosa. Pondo-o de volta no bolso, antes de sair, Ícaro pega o porta-retrato com a foto de sua mãe em cima do bidê e o beija. Quando ele põe o porta-retrato no lugar e sai de casa, a câmera foca na foto de Claudine.
Trilha Sonora: Instrumental de Suspense



Cena 10/Cortiço/Casa de Johanna e Ednna/Sala/Interior/Noite

Johanna está abrindo uma taça vinho.
Johanna: É, Johanna, a vida não é fácil não. É que nem rapadura, doce mas difícil de comer. Talvez passar um tempinho aqui no cubículo pobretão não seja tão ruim assim. Às vezes é deixando de se pensar, que vem as boas idéias...
Alguém bate à porta.
Johanna: (Resmungando:) Falei cedo demais.
Johanna vai até a porta, e a abre. Ao ver a pessoa que havia batido, Johanna fica boquiaberta.
Johanna: Al...Al...Alfredo?!
Alfredo: (Sorrindo:) Oi, meu amor.
A cena congela com um guarda-chuva rosa parando ao lado de Johanna, totalmente confusa.
Trilha Sonora: I Will Survive – Gloria Gaynor
GANCHO





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