Jornada- Capítulo 03
quarta-feira, setembro 19, 2018CENA 01 -EXT/ ARGENTINA/ MANSÃO ISOLADA /NOITE
Clementino Villas Boas desperta do sonífero colocado em seu suco por Sarah. Ele está desnorteado, se depara caído no chão, perto da mesa onde acontecia o jantar. Ao recordar-se do que acontecera, o rapaz corre com dificuldades até a janela e vê o carro de Sarah dando partida.
CLEMENTINO: DESGRAÇADA. {Sussurrando por ainda estar fraco}.
Clementino desce as escadas apressado e vai até a garagem para chegar ao seu veículo lá estacionado
CENA 02 - EXT/ARGENTINA/ESTRADA ESCURA/CARRO DE SARAH/NOITE/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Sarah dirige por uma estrada de terra esburacada, ela está indo em direção à cidade. Pelo retrovisor ela vê um dois faróis de carro se aproximando na escuridão, logo atrás dela.
SARAH: Não pode ser, que merda {Irritada e com um leve tom de medo na voz}.
A golpista pisa no acelerador, na tentativa de despistar Clementino, agora o seu ex parceiro de crimes.
Em certo ponto da perseguição, Sarah perde o controle e acaba capotando com o carro. Desesperada, ela tenta sair dos escombros, mas é tarde demais. Ela ouve o veículo do rapaz parando perto do dela, a porta se abrindo e passos na terra cada vez mais audíveis.
CLEMENTINO: Que feio, querida. Roubando a única pessoa que te estendeu a mão. Saímos juntos do Brasil para ajudarmos nossas famílias. Achei que fossemos parceiros. {Debochando, parado em frente ao carro destruído}.
SARAH: Nós éramos parceiros, até você começar a tomar posse do que é meu. As pérolas são minhas. {Voz sofrida por estar presa nos destroços do veículo.
CLEMENTINO: E quem foi que comprou a mansão em que você dorme todos os dias? Fui eu, Sarah.
SARAH: Agora ela vai ser toda sua.
CLEMENTINO: Você vai voltar a ser aquela miserável rampeira que eu conheci no Rio.
Sarah começa a rir das palavras ditas por Clementino. Sons de sirenes se aproximam, acompanhados por luzes vermelhas e azuis. Eram carros da polícia e ambulâncias.
SARAH: Você é que vai voltar a ser o merda de antes.
Clementino não entende.
SARAH: Todo mês eu tiro 50.000 da sua conta, isso já acontece desde o começo do mês e olha que já estamos no dia 23. {Rindo}.
Clementino não faz nada por conta da chegada da polícia.
SARAH: Socorro! Esse homem estava me perseguindo, ele quer me matar! {Forçando choro, desesperada}.
A polícia rende Clementino, e Sarah é tirada do veículo capotado pelos paramédicos. Ela é levada pela ambulância para um hospital na cidade.
CENA 03 - INT/ARGENTINA/CASTELO DOS NARRETI/QUARTO DE JONATHAM/MANHÃ/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Amanhece na Argentina. Takes das belas montanhas ensolaradas.
Jonathan se prepara para o confronto iminente entre sua família e o cartel dos De Giovanni. Esse cartel estava se rebelando contra a soberania dos Narreti. Jonathan toma seu café da manhã.
Um homem chega ao local vazio.
NICOLÁS: Está na hora, Jonathan.
JONATHAN: Já estou indo. {Insegurança na voz}.
A porta se fecha e Jonathan continua ali, apreensivo. Ele está vestido de preto e com um colete a prova de balas.
CENA 04 - INT/ARGENTINA/CASTELO DOS NARRETI/SALA DE REUNIÕES/MANHÃ/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
De pé, perante os outros membros do cartel fortemente armados e com Enrico ao seu lado, Enzo vê Jonathan entrando na sala.
ENZO: Já que estão todos aqui, vamos recapitular o plano. Nicolás vai com seu grupo pelas florestas, para fortalecer a nossa retaguarda. Juan segue pela estrada principal junto ao seus soldados, sendo auxiliados por Matias.
Os comandantes de cada grupo concordam, os membros menores (soldados) também.
Jonathan passa pelo aglomerado de soldados para chegar até em Enzo.
JONATHAN: Pai, o que eu vou fazer?
ENZO: Você vai junto com Nicolás, ainda é muito novo, tem apenas 16 anos, vai viver para lutar em novos conflitos. Ajude-o na retaguarda.
ENRICO: Este será o primeiro e último motim, meu pai. Pode acreditar, depois de hoje as coisas irão mudar por aqui.
ENZO: Deus te ouça, Enrico.
Enrico fita Jonathan, que desvia o olhar intimidador do irmão.
CENA 05 - INT/ARGENTINA/HOSPITAL DE USHUAIA/MANHÃ/CONTINUAÇÃO DIREITA DA CENA ANTERIOR.
Sarah repousa na cama do quarto de um hospital qualquer da cidade. Está com um olhar irritado. Uma enfermeira velha e gorda de cabelos cacheados entra no local.
SARAH: Enfermeira, quero ir embora logo. Facilite o meu lado, amor.
ENFERMEIRA: O médico disse que você só receberá auta amanhã de manhã. {Ela falava português, devia ser uma brasileira}.
SARAH: Mas eu estou bem, posso pular nessa cama se for necessário, fazer agachamentos, qualquer coisa.
A enfermeira faz um estalo com a boca, como quem não acredita no que é dito.
ENFERMEIRA: Vocês jovens são todos iguais, acham que são de ferro. Você acabou de capotar um carro e acha que está em boas condições de levantar dessa cama. Aliás, garota, soube que foi uma perseguição.
Sarah balança a cabeça em concordância, seu clima alegre se foi.
ENFERMEIRA: O que houve? Deu calote no cliente? Você está mais do que certa, os homens dessa região são tão pobres que parecem ter nascido na vala. {Ela fala enquanto analisa o prontuário da garota}.
SARAH: Pra uma enfermeira, você é bem invasiva. E eu não sou uma prostituta. {Ela diz com tranquilidade, aquilo não a ofendia}.
ENFERMEIRA: Então me diga, quem é o sujeitinho que está causando bafafá na delegacia aqui no lado. Ele diz que foi roubado.
.
SARAH: Você é quem? A delegada do hospital?
ENFERMEIRA: Brasileiros ajudam brasileiros no exterior.
SARAH: Conta outra, só tem pária por aqui. E eu não sou diferente.
A porta é aberta e dois oficiais acompanhados por um delegado adentram o quarto.
DELEGADO: Senhorita Sarah, com licença. {Falando espanhol, o idioma local}.
SARAH: Vá em frente. {Também no idioma local, tom de afronte}.
DELEGADO: Devido ao seu estado, gostaria de saber se a moça poderia responder a algumas perguntas.
SARAH: Sim, eu posso. {Tom frio}.
O escrivão se prepara para começar a escrever na mesa do quarto.
DELEGADO: O rapaz Clementino afirma com veemência que foi roubado pela moça. O que tem a dizer a respeito disso.
SARAH: Eu nego todas as acusações. Isso é tudo.
CENA 06 - EXT/CORREDOR DO HOSPITAL/MANHÃ/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Sarah vê o delegado falando algo com a enfermeira. Eles percebem os olhares da garota e então a porta é fechada. Instantes depois a mulher retorna ao quarto.
ENFERMEIRA: Então, garota. É melhor que saiba que você só será liberada quando esclarecer toda essa história, ordens do delegado.
Sarah leva a mão ao rosto, preocupada.
SARAH: Qual é o seu nome, amor?
ENFERMEIRA: Sandra. {Sem entender a pergunta}.
SARAH: Sandra, eu tenho dinheiro, muito dinheiro, posso transformar sua vida para sempre. Nós duas compartilhamos alguns pensamentos, somos um pouco parecidas. Eu vou direto ao assunto, me deixe sair daqui e você vai ter uma chance de mudar de vida, a melhor das chances. (Tom manipulador).
A enfermeira se aproxima da cama de Sarah
ENFERMEIRA: Olhe bem pra mim, garota. Veja se eu tenho cara e idade de quem procura dinheiro. Tudo o que você pode fazer por mim é me dar todos as horas, dias, anos, que perdi sendo humilhada neste hospital, mas você não pode fazer isso, não é? A não ser que seja um anjo e eu não saiba ou então...um demônio.
Sarah a encara e dá um leve sorriso, achou engraçado o quase monólogo da enfermeira.
SARAH: Não seja falsa, Sandra. O dinheiro é uma coisa que todos querem, ele move o mundo. Não vale a pena viver nessa linda mentira.
A enfermeira faz uma cara de quem sente pena.
ENFERMEIRA: Você vai sofrer muito nessa vida, garota. O caminho que está escolhendo tem um destino fixo para todos que o seguem.
SARAH: Eu já sofri muito nessa vida, agora colho os frutos deste sofrimento. A senhora não sabe absolutamente nada sobre mim. {Ela se aproxima do rosto de Sandra, falando em tom frio}.
As duas ficam cara a cara, em silêncio.
ENFERMEIRA: Vá embora.
Apressada, Sarah tira o manto do hospital e veste suas roupas. Ela não encontra suas pérolas douradas na bolsa posta dentro no cesto de utensílios feito para pacientes. Ela então, lentamente, olha na direção da enfermeira.
Rindo, Sandra tira as pérolas do bolso da sua roupa de enfermeira e as mostra à Sarah. Antes que ela pedisse, a mulher joga as jóias na direção de Sarah, que as pegam no ar.
SARAH: Obrigado, fique com uma. Pra você ver como eu posso ser generosa. { Ela deixa um dos colares de pérolas na cama}.
A enfermeira não consegue esconder o deslumbre ao ver aquelas pérolas em sua mão.
Sarah deixa o quarto e caminha pelos corredores do hospital, rumo à saída. O delegado e a polícia haviam ido embora.
CENA 07 - EXT/AEROPORTO/TARDE NEVADA/CONTINUAÇÃO INDIRETA DA CENA ANTERIOR.
Roberto Dela Justina desenbarca no aeroporto de Ushuaia.
CENA 08 - EXT/RUAS DE USHUAIA/TARDE ENSOLARADA/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Com uma grande mochila nas costas, Roberto vaga pelas ruas, fascinado com a beleza do lugar frio.
ROBERTO: Província da Terra do Fogo, lar de Ushuaia. {Fala consigo mesmo}.
Após se hospedar em um hotel, Roberto verifica seu saldo no caixa eletrônico e volta a caminhar junto aos passageiros, que desembarcaram com ele na cidade. Um guia turístico local os guiavam.
CENA 09 - EXT/PÁTIO DA AGÊNCIA DE TURISMO/TARDE NEVADA/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
GUIA: Muito bem, podem entrar no ônibus, pessoal. Vamos conhecer as belezas do interior dessa província. {Ele era um pouco mais velho que Roberto, tinha um tom aventureiro}.
Roberto e os outros turistas entram no ônibus e então o veículo parte.
CENA 10 - EXT/ RUA QUALQUER, SINAL FECHADO/TARDE NEVADA/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Sarah bate na porta do veículo.
SARAH: Me dá uma carona aí, Iago. {Pedindo, com uma bolsa em mãos. Aquele era o nome do guia}.
IAGO: Tô trabalhando, Sarah. Cadê seu namorado? {Falava um português desleixado}.
SARAH: É só até em casa, fala sério, não custa nada, é caminho pra você.
Roberto não deixa de prestar atenção na conversa.
IAGO: Tá bom, Sarah. Entra. {Bufando}.
A porta é aberta e a garota entra, olhando de relance para Roberto enquanto procura um assento. Ela se joga no fundo do ônibus, sentando com os pés no banco.
CENA 11 - EXT/ESTRADA RODEADA POR FLORESTAS E MONTANHAS/TARDE NEVADA/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Os soldados do cartel Narreti aguardam pela chegada dos De Giovanni. Cobrindo a retaguarda entre a floresta, Jonathan aguarda junto à Nicolás. Os dois não tiram o olho do bloqueio feito na estrada pelo grupo de Enzo e Enrico, que aguardam pela chegada dos traidores.
Nicolás, um homem velho, observa os arredores com um binóculos. Ele percebe a tremedeira de Jonathan.
NICOLÁS: Fique tranquilo, filho, essa luta não é sua.
JONATHAN: Do que está falando?
NICOLÁS: Ao longo dos anos, seu pai e seu irmão vêm cuspindo na cara dos traficantes da Terra do Fogo, um solo já manchado de sangue o suficiente. Todos se renderam perante os Narreti, aceitaram trabalhar para vocês. O que acontece agora é apenas o estopim. Sorte tiveram sua mãe e sua irmã, que perceberam tudo antes de todos e foram embora para bem longe. A filha em especial, também, a coitada sofreu nas mãos de seu pai, foi mandada para vários países. Deus sabe onde elas estão agora.
Jonathan pensa em silêncio.
NICOLÁS: Desculpe, filho. Sei que isso te machuca.
JONATHAN: Eu quis ficar, assim como Enrico. Mas não sei dizer se valeu a pena. Penso se não seria o certo encontrá-las e ter uma vida normal.
NICOLÁS: Se quer um conselho, eu acho que você não deveria abandonar o que é seu.
JONATHAN: Mas Enrico é o mais velho.
NICOLÁS: Ele não tem competência para comandar um império como o de seu pai, é explosivo e incompetente. Você, Jonathan, acredito eu, é o único filho que tem chances de conseguir isso.
Um carro se aproxima pela estrada e desacelera até parar na altura do bloqueio dos Narreti. Dois homens saem de dentro dele.
ENZO: Giovanni, que tal explicar o que está acontecendo. Os boatos são verdadeiros?
Giovanni é um homem tão velho quanto Enzo. O homem ao lado é seu filho, César.
GIOVANNI: Esta província precisa de um líder de verdade, não de uma fraude como você, Enzo. Seu cartel envergonha os traficantes dessa cidade. Todos aqui perdem dinheiro diariamente por causa do seu nacionalismo idiota, por só querer vender dentro da Argentina. Eu estou aqui pra propor uma rendição pacífica.
Enzo não diz nada. Enrico, friamente, saca uma arma e dá um tiro certeiro em Giovanni, matando-o.
O "exército" dos Narreti concentrado nas florestas que rodeiam a estrada, é pego desprevenido pela rebelião dos traficantes de Ushuaia. Rapidamente os soldados vão sendo aniquilados.
Nicolás e Jonathan, admitido a derrota, fazem de tudo para continuarem vivos.
CENA 12 - EXT/ÔNIBUS/ESTRADA DO INTERIOR/TARDE NEVADA/CONTINUAÇÃO INDIRETA DA CENA ANTERIOR.
IAGO: Pessoal, estamos chegando na região dominada pelo cartel que desafia todas as leis deste país que vocês possam imaginar, é a província da Terra do Fogo. São quilômetros e quilômetros de picos nevados e florestas, um passeio por aqui pode ser uma das melhores coisas que você já fez na sua vida, mas também pode resultar no fim dela. {Brincando e rindo. É notável que ele não sabia falar o espanhol corretamente}.
O guia percebe o bloqueio emergindo na estrada, com sons de tiroteio sendo escutados aos poucos. O ônibus para no meio da estrada, por conta dos tiros, próximo a um banner de "Bem Vindo a Ushuaia"
IAGO: Não acredito. {Pasmo}.
Os turistas ouvem os tiros intensos e se jogam no chão do ônibus. Roberto tenta manter a calma perante o desespero, ele rapidamente ajuda uma idosa a ir para o chão.
IAGO: Fiquem abaixados! Não levantem.
Os tiros atravessam as janelas do veículo, acertam alguns bancos.
ROBERTO: Liga pra polícia! {Ele berra para o guia}.
O som das rajadas de metralhadora é tão violento que poderia deixar qualquer um surdo.
ROBERTO: Pelo amor de deus, eu não quero morrer. {A voz de Roberto fraqueja}.
Jogada na chão, Sarah observa tudo.
Os tiros diminuem.
SARAH: Temos que sair daqui agora, esse ônibus pode acabar explodindo a qualquer momento.
IAGO: Por que isso tinha que acontecer logo no meu turno? {Lamentando}.
ROBERTO: Eu vou sair pra ver como tá a situação.
Roberto sai do ônibus cuidadosamente e analisa a estrada e as florestas, de onde agora vinham os tiros. Haviam homens caídos, ensanguentados, mortos.
ROBERTO: Que horror.
Sarah também sai do veículo e fica pasma. Ele não largara a bolsa com as pérolas nem por um minuto.
Àquela altura já não se ouvia nenhum tiro.
SARAH: Guerra entre carteis, há muito tempo não aconteciam.
ROBERTO: Você sabe o que se passa por aqui?
SARAH: Eu e meu ex namorado vimos muita coisa por aqui, morávamos atrás das montanhas. Sempre tive curiosidade.
A garota corre para dentro da floresta. Roberto acaba indo junto, meio que automaticamente.
CENA 13 - EXT/CAMPO ESVERDEADO/FIM DE TARDE/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Nicolás ajudava Jonathan a carregar o pai e o irmão de volta ao castelo dos Narreti, sendo acompanhados pelos homens sobreviventes.
JONATHAN: Aguentem firme, já estamos chegando. {Cansado}.
Enzo murmurava coisas sem nexo e Enrico não emitia uma palavra.
ENZO: Tudo o que eu construí minha vida inteira...se foi...minha honra se foi...minha filha se foi...o amor da minha vida... {Lamentando com lágrimas nos olhos}.
NICOLÁS: Aguente meu amigo, estamos perto.
ENZO: Deixe-me aqui, eu exijo.
JONATHAN: Mas pai...
ENZO: É uma ordem.
Nicolás coloca Enzo na grama do campo. O líder do cartel leva seus olhares para as nuvens do fim de tarde, com um olhar emocionado.
ENZO: Eu estou morto... já estava na hora...vivi cada dia como se fosse o último. Tudo valeu a pena. Consegui a proeza de fazer os traficantes dessa cidade trabalharem para mim, servirem minha família como súditos servem aos seus reis. {Sussurrava para si mesmo}.
Jonathan o observa, bem próximo, contendo as lágrimas. Ele olha para Enrico e repara que os olhos do irmão já não piscam mais, olhavam para o distante.
ENZO: Jonathan...cuide do que é seu.
Enzo suspira e não torna a falar, seus olhos se fecham lentamente, para sempre.
Jonathan chora feito uma criança e é amparado por Nicolás.
CENA 14 - EXT/CAMPO ESVERDEADO/FIM DE TARDE/CONTINUAÇÃO DIREITA DA CIDADE ANTERIOR.
Sarah e Roberto atravessam a floresta e dão de cara com um grande campo, que em seu fim sediava um castelo digamos que moderno.
Um grupo de homens atravessavam o campo rumo ao castelo, iam em passos lentos por conta dos ferimentos. Dois deles carregavam corpos nas costas. Jonathan ia na linha de frente, cheio de machucados e um pouco de sangue na testa.
Roberto ouve sirenes.
ROBERTO: Vamos voltar, deve ser a polícia ou então uma ambulância.
SARAH: Vá você. {O olhar da garota mudara, estava fixo no grupo de homens que caminhavam}.
ROBERTO: O que está fazendo? Vamos logo.
Sarah não diz nada e começa a caminhar na direção do grupo. Roberto acaba indo atrás dela.
SARAH: Se você quer ficar me seguindo, ao menos vai ser útil.
Sarah acelera o passo.
SARAH: Ei, vocês! {Chamando o grupo}.
O grupo para e Jonathan vira de costas, vendo Sarah distante.
SARAH: Meu ônibus foi alvejado durante um tiroteio na estrada, meu marido e eu estamos perdidos. Vocês podem nos ajudar? Já está anoitecendo. {Voz doce}.
O jovem Jonathan caminha na direção da garota. Assim que a vê de perto, ele sente algo que não consegue explicar.
JONATHAN: Do que vocês precisam?
SARAH: Uma carona ou então saber onde fica o hotel mais próximo. {Sabia bem o que queria}.
Roberto não entende nada do que está acontecendo ali.
JONATHAN: Vocês podem passar a noite na minha casa.
Sarah dá um leve sorriso.
SARAH: Não queremos incomodar.
JONATHAN: Eu insisto.
SARAH: Já está tarde, então não terei como recusar. {Tinha conseguido}.
Jonathan sorri.
CENA 15 - INT/CASTELO DOS NARRETI/NOITE/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Enquanto entram no castelo, Roberto sussurra no ouvido de Sarah.
ROBERTO: Você é completamente maluca. Olha pra esse lugar. {Irritado, o castelo meio que intimidava}.
JONATHAN: Como o seu ônibus foi destruído no fatídico tiroteio, mandarei que providenciem roupas para você... Aliás, qual é o seu nome?
SARAH: É Sarah, e este é meu marido, Roberto. Engraçado, só vejo homens aqui. De onde vai tirar roupas de mulher?
JONATHAN: Minha irmã deixou a maioria aqui quando fugiu, mas isso não vem ao caso. Nicolás, mande a cozinheira preparar o jantar de todos.
Nicolás acena positivamente com a cabeça, não gostando nada daquilo. Matias observava tudo de longe, reprovando.
JONATHAN: Já o seu marido, Sarah, pode usar algumas roupas de meu falecido irmão.
Jonathan encara Roberto de um jeito passivo agressivo.
Roberto fica em silêncio, não queria estar ali, mas o olhar apreensivo de Sarah o obriga a dizer algo.
ROBERTO: Não há necessidade, eu posso usar a minha roupa até amanhã de manhã.
JONATHAN: Fica tranquilo, Roberto, meu irmão não se importaria. {Mentindo}.
SARAH: Jonathan, você pode nos levar até o quarto em que vamos passar a noite?
JONATHAN: Mas é claro.
CENA 16 - INT/CASTELO DOS NARRETI/NOITE/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Jonathan abre a porta da suíte.
JONATHAN: É aqui, vou mandar trazerem as roupas para cá. Quando estiverem prontos, desçam para o jantar.
Jonathan fecha a porta. Roberto e Sarah ficam ali, no silêncio.
ROBERTO: O que é que você tem na cabeça? Por que fez isso tudo?
Sarah interrompe o escândalo silencioso de Roberto.
SARAH: Vou te explicar. Esse Jonathan é filho caçula do dono do maior cartel que Ushuaia já teve, eles dominam toda essa região. Eu não deixo oportunidades passarem batido.
ROBERTO: Você é maluca, essa gente é perigosa, você não tinha o direito de me meter nisso. Pode se preparar, pois eu vou te denunciar pra polícia.
SARAH: Eu estou pensando no meu futuro, meu amor. Não se preocupe, por que eu vou conseguir te arranjar algum dinheiro, você não está fazendo isso de graça. Você só está aqui por que é muito mais fácil conquistar um homem quando se é "casada", homens sentem um prazer nisso, cornear uns aos outros.
ROBERTO: Eu não quero nenhum dinheiro, ainda mais um sujo como esse, dinheiro de sangue.
SARAH: Você não tem escolha, só sai vivo daqui junto comigo. Esse Jonathan não demora muito e já vai começar a querer te despachar pro vale dos desalmados.
ROBERTO: Nesse seu plano perfeito de dar um golpe num filho de dono de cartel, onde é que eu sou libertado das garras de vocês?
SARAH: Talvez amanhã.
ROBERTO: Talvez?
SARAH: Não trabalho com certezas. Relaxa, garoto. Aproveite a mordomia que esse bandidinho vai nos proporcionar.
Quando Roberto deixa o quarto, Sarah tira as pérolas douradas da sua bolsa e as guarda de baixo de um travesseiro da cama.
CENA 17 - INT/CASTELO DOS NARRETI/SALA DE REFEIÇÕES/NOITE/CONTINUAÇÃO DIRETA DA CENA ANTERIOR.
Jonathan aguardava sentado sozinho à uma longa mesa repleta de comida pela chegada dos dois. A decoração do castelo era vintage, a iluminação se dava por tochas.
JONATHAN: Finalmente, estava a espera de vocês.
SARAH: Desculpe pela demora. {Em tom submisso}.
Roberto fica em silêncio. Os dois se sentam à mesa e o jantar começa..
JONATHAN: De onde o casal vêm? Obviamente não são daqui.
SARAH: Viemos do Brasil, em busca de oportunidades.
JONATHAN: Que tipo de pessoa vem para Ushuaia em busca de oportunidades?
Jonathan dá uma risada.
Sarah força um riso, que sai de maneira apreensica. Roberto a imita.
JONATHAN: É apenas uma brincadeira mas, convenhamos, Buenos Aires seria o lugar ideal para isso.
Jonathan percebe que os olhares de Roberto analisavam cada detalhe da sala do castelo.
JONATHAN: Vocês sabem onde estão? {Ele toma um gole de conhaque}.
SARAH: Na casa de um rapaz bondoso?
Jonathan força um riso.
JONATHAN: É, pode ser, mas também é o lar do cartel dos Narreri. Conhecem?
Um silêncio toma conta da mesa.
SARAH: Já ouvi falar.
JONATHAN: Já ouviu falar? Isso é meio óbvio. E você, Roberto?
Roberto o fita.
JONATHAN: Não vai se juntar à conversa? Está parecendo um bicho do mato.
ROBERTO: É que ainda estou digerindo as coisas que ultimamente tem acontecido em minha vida.
JONATHAN: Quer ir se deitar?
Roberto pensa.
ROBERTO: Não seria uma má idéia, é melhor eu ir mesmo. {Disfarçando sua raiva}.
Roberto sobe as escadas, rumo à suite.
Jonathan e Sarah ficam se olhando por instantes, agora só há eles na mesa e na sala.
JONATHAN: Sabe Sarah, hoje eu perdi meu pai e meu irmão em um confronto. {Começando a desarmar-se}.
Sarah o olha, séria.
SARAH: Nossa, eu lamento muito.
JONATHAN: E você nem se quer teve a decência de respeitar isso.
Sarah mantém seu olhar frio.
JONATHAN: Tenho que admitir, juntos, nós dois podemos fazer coisas inacreditáveis. Veio até mim por causa do dinheiro e eu te digo que estou falido, não sou capaz de reconstruir o império de meu pai, muito menos de comandá-lo, mas digo também que você, Sarah, é a peça que falta para essa engrenagem fluir.
Sarah ouve bem cada palavra dita por Jonathan.
JONATHAN: Estou propondo uma parceria.
SARAH: Para um garotinho de 15 anos, você se acha bem inteligente. E por que eu precisaria de você nisso? Se quisesse, criaria meu próprio negócio.
JONATHAN: 17, na verdade. Eu tenho nome, categoria. Sem mim, você não é nada. E sem você, eu também não sou. Sua frieza é o que falta nesse novo cartel dos Narreti. A pompa em suas palavras mostra que você é uma típica golpista em busca da aposentadoria perfeita. Estou te dando uma oportunidade. E então, o que me diz?
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